Adotar uma criança: limites e possibilidades.

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Os sentidos possíveis de ser homem e mulher perpassam as funções parentais. Procriar parece ser um referencial de identidade de gênero. O desejo de ser pais também perpassa a trama a identificatória com os próprios pais.

Alterar o projeto de parentalidade e vivenciar a experiência de infertilidade pode gerar culpa e vergonha, muitas vezes produzindo um estigma social, que pode acarretar alienação e isolamento.

Sentimentos de inferioridade e queda na autoestima, assim como depressão e de ansiedade elevada, podem desencadear severas perturbações nas esferas emocional, da sexualidade e nos relacionamentos conjugais.

A adoção surge nesse contexto como uma possibilidade. É um processo de inserção no ambiente familiar, de forma definitiva, de uma criança cujos pais morreram, são desconhecidos, não podem ou não querem assumir o desempenho das suas funções ou foram considerados inaptos pela autoridade competente.

            Entretanto, adotar um filho, por parte dos pais, revela mais do que o desejo de ter um filho. Revela necessidades específicas de cada sujeito, reflexos de suas histórias psíquicas, que repercutirão na relação a ser estabelecida com a criança, assim como certa dose de idealização. O mesmo acontece com as crianças. Além do desejo de serem adotadas apresentam uma idealização da família de origem juntamente com o esforço para conservar uma imagem positiva dos genitores. Assim, o conflito entre o passado e a realidade se faz presente no contexto da adoção.

Mesmo assim, a ilusão criadora supera os primeiros momentos pós-adoção, de tal forma que se assemelham ao que ocorre em um nascimento, exemplificado por momentos de idílio entre pais e filhos, quando são observadas intensas expectativas de satisfações pessoais. Pais encantados, envolvem a criança com atenções e cuidados. A criança por outro lado, deseja ser o único e exclusivo objeto do amor dos pais, em um movimento de reconstrução de um bom objeto de apego primário.

Com o passar do tempo, entretanto, surge a fase da desilusão estruturante.  Afinal, pais e filho precisam incorporar um novo modelo de família apesar do antigo. É Experiências adversas vividas no período que antecedeu a adoção se fazem presentes, por exemplo, as complicações ao nascimento, negligência e/ou maus-tratos vivenciados na família biológica, cuidados em contexto institucional pouco individualizados. Nessa fase é preciso sobreviver às atitudes agressivas, ataques de fúria ou de silêncio que podem surgir. Sobreviver é não retaliar os ataques, pois a retaliação só viria confirmar para a criança, no plano da realidade, o seu poder de destruição, e consequentemente a ameaça representada pelo ambiente, fazendo-a reviver o trauma da rejeição.

            Superada essa fase, a nova família pode vivenciar o sentido de pertenciamento. É preciso se dispor a lidar com o diferente, suportar frustrações, a falta de vínculo, além de desenvolver a capacidade de conter a agressividade da criança e dar-lhe um sentido de vida. Lutos do passado e das expectativas podem dar espaço ao cotidiano real. São comuns esforços para que a adaptação de ambos os lados. É fundamental que os adotantes estejam disponíveis para acolher as necessidades emocionais mais primitivas da criança e revejam suas expectativas. O “estrangeiro em casa” precisa deixar de existir.

            Assim, a figura de um profissional de saúde é fundamental, uma vez que, cada caso demanda um tempo e um manejo específicos. É necessário se pensar em estratégias apropriadas, de modo que possam ser minimizadas as probabilidades de fracasso, uma vez que, adoção é uma tarefa desafiante, considerando, por um lado, as experiências prévias de separação e de perda que podem dificultar a construção de uma relação seletiva e diferenciada com os novos pais.

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